quinta-feira, 19 de julho de 2012

Como demonstrar amor?

   Li um texto do Bruno Astuto e fiquei pensando sobre as demonstrações de afeto que são tão raras hoje em dia. Resolvi postar um trecho que fala muito bem do que estamos nos tornando no meio de tanta informação. Essa primeira parte que eu vou postar, é uma amiga do Bruno falando.

" “Antes de me casar, tive vários namoradinhos que sempre reclamaram do meu jeito fechado. Mas era simplesmente impossível para mim dizer o que sentia com tanta facilidade. Fui criada por pais amorosos, mas do jeito deles — era raro quando eles diziam que amavam a mim ou aos meus irmãos. Acho que minha grande influência foi a minha avó, que me dizia para tomar cuidado para não virar peteca na mão dos homens. E eu via o exemplo dos meus irmãos, que se desmanchavam para as meninas e, pelas costas, debochavam porque elas estavam no papo. Elas eram completamente românticos e melosas, e, quanto mais se apegavam, mais eles corriam. Disse pra mim mesma: ‘nenhum homem vai me chamar de melada’. Formei uma casca grossa, e conheci o meu marido.
Éramos amigos de faculdade, mas só começamos a namorar depois. Ele era o que a gente chama de galinha, mas isso era coisa da idade. Com o tempo e alguns perdões depois, engrenamos num relacionamento maravilhoso. Nós nos entendíamos muito bem, ganhamos dinheiro juntos, ele não economizava nas gentilezas. Só eu que não conseguia vencer a barreira de dizer a ele o quanto eu o amava. Nos primeiros anos, ele pedia que eu dissesse as palavras mágicas, mas eu não disse. Quando ele vinha me abraçar, cheio de chamegos, eu respondia: “tá, tá, vou fingir que acredito”, numa postura cínica em relação ao amor dele, o que era injusto, porque ele já tinha me dado várias demonstrações de que era um amor verdadeiro. Acho que eu passei nosso casamento inteiro tentando que ele provasse que me amava de verdade e, a cada prova que ele dava, eu queria outra maior para, enfim, poder dizer o que eu sentia e o que ele queria ouvir. A morte dele foi uma estupidez, ele era novo demais e merecia ter sabido, em bom português, o quanto ele era amado pela sua mulher. Hoje vejo que gestos não bastam; dizer é parte da natureza humana. Vejo pelos meus sobrinhos que os jovens não sabem mais o que é romantismo, que eles se tornaram robôs que encontram e desencontram pessoas na balada e que namorar é um ato banal, de passar um tempo juntos dando beijo na boca”.
Respondi a essa amiga que ela não deveria se culpar; que seu marido, um sujeito mais do que generoso, sabia muito bem o quanto ela o amava, porque era um homem feliz. Mas é fato que existem impulsos que merecem escapar do controle do nosso senso de parcimônia, e que devem, sim, nos subjugar. Qual o problema de nos mostrarmos frágeis de vez em quando? Quem disse que nós só devemos abrir a boca quando tivermos certeza do que sentimos, posto que a certeza muda tanto com o passar do tempo? Num mundo sem toques, olhares e os sons das vozes, de carinhos vazios de Twitter e Facebook, protegidos pela tecla de um computador, o grande desafio do ser humano é ir além do “cutuco” das redes sociais, pegar um carro, enfrentar o trânsito, subir o evelador, tocar a campainha e dizer, sem medo, o que sente. Essa geração, que começou na minha, quando a AIDS explodiu e nós ignorávamos a realidade da doença, aprendeu que é preciso se distanciar para não se envolver. Para ela, o futuro dos Jetsons chegou de fato — não em termos dos carros voadores, mas dos capacetes invisíveis que protegem do contato físico e mantêm as emoções enclausuradas numa sinistra assepsia. "

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